ENTREVISTA
FEITA COM O PROFESSOR LUIZ PARENTE A RESPEITO DA ÁFRICA E AS SUAS ATUALIDADES
PERGUNTA: O que você acredita que
foi fundamental na luta dos negros para abolir a escravidão?
RESPOSTA: Alguns fatos foram fundamentais para a
conquista da liberdade dos negros africanos escravos aqui no Brasil, portanto
não há um
único fator. Os africanos que foram trazidos
para o Brasil, já tinham na África um “espírito de liberdade”, ou seja, um
sentimento de liberdade em suas terras. Esse sentimento veio em sua bagagem.
Apesar do processo escravagista implantado em nosso país dar ênfase a africanos
de diversas etnias, com o intuito de evitar rebeliões, já que estes falavam
diversos idiomas. Esse método não deu tão certo, já que sentimento, como o
amor, a liberdade, a democracia não tem idioma que separe um povo do outro. E
com o passar do tempo, esses africanos representando diversas etnias,
aprenderam a se comunicar em português. Assim foram criando estratégias de
libertação, como as fugas em massa de fazendas de cana-de-açúcar, algodão,
fumo, e a implantação de quilombos em vários pontos do país. A Bahia, em
especial, não foge a essa regra, por exemplo, alguns quilombos surgiram em
áreas que atualmente compreendem a zona urbana de Salvador, como os bairros do
Calabar e do Cabula. Vale destacar também, a participação dos abolicionistas
brasileiros que influenciaram a sociedade da época a favor da libertação dos
negros, como Castro Alves (baiano, chamado de poeta dos escravos), Luiz Gama
(advogado baiano e mestiço, filho de uma negra e de um fidalgo português),
Joaquim Nabuco (principal abolicionista no parlamento brasileiro), o teatrólogo
Artur Azevedo, o engenheiro André Rebouças, mestiços como o jornalista José do
Patriocínio, e outros exemplos de brasileiros que fizeram das lutas
abolicionistas. Além disso, no final do século XIX, a Inglaterra, maior potência
econômica e industrial da época desejava ampliar seu mercado consumidor e fazia
pressão à monarquia brasileira para por fim à escravidão, não por causa da
bondade de seus súditos, mas porque, os escravos libertos, seriam de algum modo
um obstáculo a ampliação do comércio dos produtos manufaturados inglês, e com a
libertação dos negros, estes passariam a condição de assalariados e seriam
também consumidores dos produtos ingleses.
PERGUNTA: Para você, em que aspecto
a resistência negra contribuiu para o fortalecimento da ideia de liberdade no
Brasil?
RESPOSTA: A resposta para esse questionamento
praticamente foi respondida anteriormente. Quando falei do espírito de
liberdade que os africanos trouxeram na bagagem, ou seja, em seus sentimentos,
e isto é uma coisa universal. Esse sentimento aliado a fundamental ingerência
dos abolicionistas de diversas classes sociais. A campanha cívica que pôs fim à
escravidão no Brasil contou com a participação de vários setores da sociedade
brasileira, à exceção dos grandes proprietários de terra - como os
cafeicultores paulistas, que certamente perdiam com o fim da mão de obra
escrava.
PERGUNTA: Observando nossa fauna e flora, comidas e crenças, o
que a identidade cultural brasileira deve aos africanos e a África de um modo
geral?
RESPOSTA: Em
relação a nossa fauna e flora, de certo modo há uma identidade climato-botânica
entre o Brasil e a África, a exemplo das Savanas que possuem semelhanças com o
Cerrado aqui no Brasil, é bom destacar as diferenças no que se refere a fauna
desse dois biomas, mas do ponto de vista botânica, há muitas semelhanças, como
o predomínio de uma formação vegetal herbácea com árvores esparsas com troncos
e galhos retorcidos e casca grossa, apesar da existência de plantas endêmicas,
ou seja, aquelas que só existem naquele ambiente. Em relação ao clima desses
dois biomas, em ambos se destaca o clima tropical semiúmido, com verões
chuvosos e invernos secos. Outro bioma que tem um similar aqui no Brasil e na
América do Sul é o Equatorial, aqui falamos na Floresta Equatorial Amazônica e
lá, a Floresta Equatorial do Congo. As duas são ambientes formados por
florestas densas, fechadas, latifoliadas e muita umidade e calor o ano inteiro,
características próprias do clima equatorial. Os dois biomas são atravessados
pela Linha do Equador. São marcados também pela grande biodiversidade e rios
caudalosos, como, por exemplo, o Amazonas (mais extenso rio do mundo, além de
ser o de mais volume de água) e o Rio Congo (o segundo em volume de água do
mundo). Do ponto de vista cultural, nós brasileiros temos muitas identidades
com os africanos, o próprio tráfico explica isso. A miscigenação entre esses
povos, os indígenas (que não podem ser esquecidos) e os europeus
(principalmente portugueses), criaram uma sociedade mestiça. Nós assimilamos
muito do que os africanos trouxeram para esse lado do Atlântico. Aqui, os
africanos incorporaram elementos religiosos do catolicismo e juntaram aos ritos
religiosos que foram trazidos da África, surgindo uma concepção religiosa
afro-brasileira, como é o caso do candomblé. Com a influência africana se
fortalecendo, a culinária brasileira foi se adaptando aos ensinamentos dos
africanos. Gostaria de destacar que mesmo numa família brasileira, cuja árvore
genealógica não apareça nenhum representante negro, de alguma maneira, esses
brasileiros incorporaram a cultura africana, através das músicas, das danças e
de outras manifestações culturais, sem contar que segundo prove o contrário, os
primeiros fósseis humanos foram encontrados na África.
PERGUNTA: Os avanços tecnológicos ocorridos nos últimos séculos permitem um enorme
salto da produtividade agrícola. Você acredita que isto aconteceu em algumas
partes da África? E como funciona?
RESPOSTA: Eu particularmente acredito que houve um avanço na produtividade
agrícola em vários países, mas na África, a situação é diferente porque, a
partir da colonização europeia por lá, os europeus desestruturaram a
agricultura de subsistência dos diversos povos africanos. As potências
europeias, principalmente, a partir das decisões tomadas na Conferência de
Berlim ( 1885 ), partilharam a áfrica entre si. Era a época da 2ª Revolução
Industrial. Nesse período, os países colonialistas e industriais europeus implantaram
um sistema agrícola que os africanos não conheciam, a chamada agricultura
comercial ou PLANTATION, cujo objetivo era atender as necessidades dos
dominadores europeus, portanto estes não estavam preocupados com o bem-estar
dos povos locais. O sistema agrícola africano até hoje tem como objetivo
principal atender ao mercado externo. Além da interferência externa, as
condições climáticas em alguns pontos da África também contribuem para que a
produção agrícola de seus países seja insuficiente para alimentar a população
do continente, como ocorre na borda sul do Saara, numa região chamada de Sahel,
que é uma área de clima semiárido que está em processo de desertificação por
causa da ação conjunta de elementos naturais e antrópicos.
PERGUNTA: O que você pensa sobre o fato de que mesmo após a independência, os
africanos nascidos no Brasil sofriam restrições no exercício dos direitos
políticos?
RESPOSTA: A independência do Brasil foi em 1822, a abolição dos escravos, em 1889,
então entre dois períodos, os negros não tinham direitos em nosso país. Agora,
após 1888, os negros continuaram sem muitos direitos, no caso da pergunta de
vocês sobre direitos políticos, eles sofreram muitas restrições e perseguições.
Até hoje nas Assembleias Legislativas estaduais e do Distrito Federal, além do
Congresso Nacional, a participação de representantes negros fica aquém da
numerosa população do país. A Bahia é um caso atípico, pois é um estado onde o
número de negros é bastante considerável, mesmo assim existem poucos deputados
estaduais e federais negros. Aqui em Salvador (maior cidade negra fora da
África), também não escapa dessa situação quando a gente observa nossos
representantes na Câmara de Vereadores com poucos negros nesta casa. Acredito
que o preconceito histórico está se perpetuando até hoje, como se fosse um
reflexo do passado. Por isso que as lutas (no bom sentido de lutar) pela
igualdade entre as pessoas, os diversos povos de várias origens, devem
continuar. Nós somos diferentes, mas somos iguais, porque o respeito tem que
ser recíproco, assim criaremos pessoas e sociedades solidárias e mais humanas.
Saindo um pouco do âmbito brasileiro, nos EUA, mesmo após a libertação dos
escravos em 1865, os negros foram privados de seus direitos, especialmente nos
estados sulistas. Por isso, por lá houve a Guerra Civil Americana ou Guerra
Norte-Sul (1861-1865), em que a escravidão do sul do país foi uma das causas da
guerra, vencida pelo Norte. Em pleno século XX, os negros estadunidenses ainda
estavam privados dos direitos civis nos estados do sul. Foi uma luta árdua,
onde um dos destaques foi o pastor protestante nascido em Atlanta, na Geórgia,
Martim Luther King. Luther King "lutou" pelos direitos civis
dos negros e dizia que: " I have a dream... " , ou seja, " Eu tenho um
sonho... ". Que sonho é este? Será que este sonho não é o mesmo de negros
brasileiros, europeus, africanos e de outros lugares do mundo ?
7 comentários:
Ótimo essa pesquisa! Deu pra entender a visão daqui do Brasil sobre a África!
Rafael Luquini, n° 33.
O professor Luiz Parente mostrou bem as lutas dos africanos em busca da liberdade. Essas lutas continuam acontecendo até os dias de hoje. Outro ponto irrelevante da entrevista foi falar do preconceito existente atualmente em relação aos negros, pois algumas pessoas não aceitam as suas origens.
Maria Juliana Amorim, nº 28 .
O professor Luiz Parente retratou exatamente pelo o que os africanos passaram , e continuam passando até hoje para conseguir seus direitos !
Adhemar Lemos, nº 01
A entrevista com o professor Luiz Parente a vinda dos africanos para o Brasil, trazendo não só sua cultura diversificada mas a ideia de liberdade e igualdade que seus decendentes lutam, até hoje, para conquista-la.
Lucas Vasconcelos Teixeira n° 26
O professor Luiz Parente mostrou as situações dos africanos escravros, as estratègias de fugas e o que contribuiu para o fortalecimento da ideia de liberdade no Brasil. Retratou também a relação existente entre a cultura brasileira e africana ao observar a fauna, flora, comidas e crenças. Os avanços tecnológicos ocorridos na agricultura brasileira que não ocorreu na África por causa da colonização europeia, e que mesmo com a independência do Brasil e abolição dos escravos, continuavam sem muitos direitos e que sofrem muitas restrições e perseguições.
Yasmin Brito nº 40.
Essa entrevista além de mostrar a visualização dos brasileiros em relação a África, nos permite aprofundar os conhecimentos sobre as estratégias de fugas, a relação da cultura africana e brasileira.
Ana Vitória Gordiano Carneiro nº 02.
Com a entrevista do professor Luiz Parente,conseguimos ter uma visão mais positiva do continente africano.Além de retratar o sofrimento continuo vivido pelos afrodescentes que buscam a igualdade racial,ele reaprensenta os acontecimentos da colonização portuguesa sobre os negros.
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